Vivências do Tempo | Museu do Amanhã

Vivências do Tempo

Relações Comunitárias

Luiz Alberto Oliveira*

O filósofo da Ciência Giorgio de Santillana dizia que toda sociedade humana elabora Imagens de Mundo, ou seja, certas constelações de ideias fundadoras a partir das quais os membros desta coletividade dão sentido à experiência de existir. Estas Imagens definem o que é o mundo, o que é a sociedade, qual é a posição de cada membro no âmbito do grupo. Mais que arquétipos apenas subjetivos, estes princípios estruturadores organizam os processos e práticas que compõem a vida concreta dos indivíduos, famílias e clãs. Noções como Centro e Borda, Céu e Terra, Antigo e Novo, Perene e Mortal, Próprio e Estrangeiro participariam assim da constituição das bases ideativas e objetivas pelas quais as culturas seriam desenvolvidas e exercidas. 

Naturalmente, um dos elementos essenciais, ainda que marcadamente variado, que operaria em todas as culturas seria a forma de conceber e vivenciar o tempo. Há, sem dúvida, uma Imagem do Tempo bem estabelecida em nossa civilização contemporânea: uma linha infinita de instantes, percorrida por um marcador único – o Agora, condensação máxima da figura do Presente – que se move incessantemente, sempre no mesmo ritmo e no mesmo sentido, sem jamais estacar ou retroceder, infatigavelmente deslocando a separação entre Passado – os presentes antigos, já percorridos – e o Futuro – os presentes inéditos, ainda por percorrer. Ainda mais notável é o prodigioso colapso da totalidade do Real – quem sabe, inumeráveis corpos, distribuídos por um espaço incomensuravelmente vasto, quem sabe – em um instante, um ponto de tempo, de cada vez: o infinito cabe num infinitésimo. Esta Imagem, gerada a partir da difusão de um extraordinário objeto técnico – o relógio mecânico – tornou-se hoje predominante em todo o planeta, e juntamente com o calendário gregoriano e os numerais indo-arábicos constituem autênticos índices do que se poderia chamar de civilização global.

Mas, longe de ser única ou unívoca, esta Imagem, ainda que dominante, coexiste com inúmeras outras formas de se constituir e experimentar modalidades de temporalidade. Diferentes formas de se vivenciar os aconteceres, suas durações, suas vertentes, vigoram no âmbito de matrizes culturais diversas, compartilhadas por numerosos setores da população. No Brasil, em particular, em vista de nosso amálgama étnico-histórico, essa variedade de matrizes constitutivas de modos de temporalizar o viver tem especial significado. A linha de pesquisa programática que denominamos de Vivências do Tempo procura trazer para o debate e entendimento públicos esta riqueza de possibilidades existenciais que as muitas brasilidades que somos nos permitem explorar.                  

*Luiz Alberto Oliveira é o Curador do Museu do Amanhã

                              
 

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