Por que o Brasil tem tão poucos cientistas?
Por Luiz Davidovich*
O Brasil possui, segundo a UNESCO, cerca de 700 pesquisadores por milhão de habitantes, enquanto a China possui 1.100, a Rússia 3.100, a União Europeia 3.200, os Estados Unidos 3.900, Coréia e Singapura 6.400, Israel 8.300. Na América Latina, o Brasil está em segundo lugar, abaixo da Argentina, que tem 1.200 pesquisadores por milhão de habitantes. Mas está muito distante ainda dos países desenvolvidos, embora esteja formando 18 mil doutores por ano.
Por que o Brasil tem tão poucos pesquisadores? Como fazer para aumentar esse número? Como estimular jovens a seguirem carreiras científicas? Essas questões são extremamente relevantes para o futuro do país, e não devem ser pensadas apenas como desafios para as universidades, e sim para as escolas e a educação como um todo.
Há, no Brasil, várias iniciativas interessantes que visam despertar os jovens para a ciência que têm ajudado milhares de crianças a ter contato com a ciência experimental, despertando a curiosidade, a paixão pelo conhecimento e o raciocínio lógico. Mas o Brasil precisa promover a aproximação do mundo da ciência não para mil, mas para milhões de crianças.
É claro que essa meta exige que o ensino básico promova o contato dos alunos com a ciência, por meio de atividades tipo “mão na massa”, envolvendo experimentos e estimulando a reflexão crítica. E, para que isso ocorra, é necessário que os professores tenham formação adequada. É importante também que sejam atraídos bons candidatos para os cursos de formação de professores.
Na Coréia do Sul, futuros professores do ensino fundamental, considerado o ciclo mais importante para a formação do aluno, devem estar entre os 5% superiores do National College Entrance Examination, o vestibular sul-coreano, devem necessariamente ser educados em uma Universidade Nacional e têm emprego praticamente garantido, com bons salários iniciais, comparáveis aos de outros graduados. Já os professores do ensino médio não precisam ser educados em Universidades Nacionais: em 2005, 59.000 candidatos disputavam 5.000 posições.
A carreira do professor também é valorizada em outros países. Na Finlândia os professores do ensino fundamental são os mais prestigiados, recebendo os salários mais altos. Em Singapura, todos os professores têm asseguradas 100 horas pagas de desenvolvimento profissional por ano. Nos Estados Unidos, diferentes cidades desenvolvem sistemas alternativos de formação de professores para a educação básica: Boston, Chicago e Nova Iorque têm um programa de residência, com seleção rigorosa de candidatos, provenientes de vários cursos de graduação, e que têm emprego garantido em escolas públicas, uma vez admitidos no programa.
Enquanto isso, no Brasil, as melhores universidades públicas formam professores para a educação básica em cursos noturnos, separados dos cursos de bacharelado dessas instituições, pois os alunos precisam trabalhar durante o dia. Recentemente, a formação dos professores tem sido aprimorada por cursos de aperfeiçoamento, os mestrados profissionais apoiados pela CAPES, em áreas como matemática, física, letras, artes e história. Um esforço meritório, que deve ser complementado, no entanto, por mudanças radicais nos cursos de licenciatura, de modo que seja alcançado o fator de escala necessário para um país como o Brasil.
Assim, o aumento do número de pesquisadores no Brasil passa por uma reformulação profunda dos cursos de formação de professores para a educação básica. É preciso atrair os melhores alunos, através da valorização da profissão, e promover cursos diurnos de licenciatura, oferecendo, mediante editais que selecionem instituições pela qualidade do quadro docente e das instalações laboratoriais, bolsas de estudo que permitam aos alunos a plena dedicação aos estudos. Disciplinas comuns com outros cursos de graduação devem ser oferecidas. Os programas devem incluir as técnicas “mão na massa” de ensino de ciências. E ter como docentes os melhores professores da instituição.
A precariedade da educação básica é um grande obstáculo ao desenvolvimento social e econômico do Brasil. Soluções existem. Mas é necessário implementá-las.
* Luiz Davidovich é presidente da Academia Brasileira de Ciências e professor titular do Instituto de Física da UFRJ