Caminhos para um mar sem poluição | Museu do Amanhã

Caminhos para um mar sem poluição

Observatório do Amanhã
Caminhos para um mar sem poluição / Foto: Pixabay

Por Tássia Biazon*

Embalagens plásticas, copos descartáveis, latas de refrigerante, são exemplos de resíduos gerados pelo ser humano diariamente. O excesso e o destino destes resíduos preocupam, pois cada vez é mais difícil encontrar locais que não sejam afetados pelo lixo humano – problema que prejudica a sociedade em diversos aspectos, como econômicos, sociais, políticos e ambientais.

Um estudo realizado pela Fundação Ellen MacArthur e o Fórum Econômico Mundial, estima que em 2050 os mares terão mais plásticos do que peixes, caso esses itens continuem chegando aos mares na concentração atual. O professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP), Alexander Turra, dá a dimensão do problema:

– A presença de lixo no ambiente marinho se deve à falta de políticas públicas para seu correto manejo, à falta de iniciativas educativas e ao excesso de consumo – afirma.

Um caminho para evitar que esse cenário se agrave no futuro é por meio de ações que informem às pessoas sobre o uso exagerado dos recursos do planeta e que proporcionem a reflexão sobre as atitudes impactantes, além do incentivo a práticas sustentáveis que fortaleçam o controle das ações governamentais pela sociedade. A parceria entre a universidade e a indústria pode viabilizar projetos educativos e, principalmente, instigar empresas a adotarem soluções inovadoras para reduzir a perda de produtos ao meio ambiente.

Universidade e empresa: construindo pontes

Durante as Olimpíadas e as Paralimpíadas Rio 2016 foi desenvolvida, na Região Portuária do Rio, a atividade “EnTENDA o Lixo”. Resultado da parceria entre IOUSP e Plastivida (Instituto Socioambiental dos Plásticos), o projeto objetivou expor à população a situação atual da saúde do ambiente marinho, além de discutir como mitigar e solucionar o problema do lixo nos mares e oceanos, utilizando como modelo a Baía de Guanabara – zona costeira que recebe grande quantidade de poluentes produzidos pelos 16 municípios que a cercam.

A atividade aconteceu em uma tenda instalada no Largo São Francisco da Prainha, entre os dias 3 de agosto e 17 de setembro, e contou com a parceria do Museu do Amanhã, Instituto Costa Brasilis, Ministério do Meio Ambiente e Prefeitura do Rio de Janeiro, além do apoio cultural da Dow.

Segundo Carlos Frederico Silva, Assessor de Desenvolvimento Econômico e Social da prefeitura do Rio, as pessoas impactadas pela ação irão multiplicar o conhecimento e aumentar o interesse de outras pessoas.

– Fiquei surpreso ao perceber o quanto estava desinformado sobre o problema. Embora a discussão esteja na mídia, muitas vezes não sabemos o que devemos e podemos fazer. O “EnTENDA o Lixo” aproxima a população da discussão e cria um espírito de pertencimento, pois todos fazem parte da solução – diz.

Em sua visão, o maior desafio é a conscientização: 

– A população costuma se preocupar com o que está visível, com o que atinge diretamente o seu cotidiano. Por mais que o lixo nos mares cause um grande impacto em nossa vida, suas interferências não estão claras. Precisamos informar como o lixo chega aos oceanos, como se formam as zonas de lixo, quais os impactos para vida marinha e para nós.

O convênio criado em 2012 entre o IOUSP e a Plastivida pretende diagnosticar e monitorar o lixo plástico que chega às praias brasileiras, conhecer as dimensões e as características deste problema no Brasil, avaliar o quanto o país contribui para o problema global, proporcionar ações educativas e disseminar boas práticas ambientais, bem como apontar tendências e buscar soluções para o problema.

– A maior causa da poluição nos mares é a falta de uma correta gestão de resíduos sólidos urbanos. Quanto pior a gestão, mais impactos haverá no ambiente marinho – informa Claudia Veiga, Assessora de Comunicação da Plastivida.

A fim de preservar os oceanos e o meio ambiente, incentivando o consumo responsável da matéria-prima e o descarte adequado do lixo, a organização iniciou atividades que propõem um diálogo com a população e demandam o envolvimento compartilhado de toda a sociedade, como o poder público, a indústria, o varejo e a sociedade civil.

O “EnTENDA” em ação

Quais são as origens e os destinos do lixo? Quais seus efeitos e as possíveis soluções? Questionamentos como estes foram debatidos durante os 40 dias do “EnTENDA o Lixo” na cidade do Rio. Dentre os resíduos recolhidos pela equipe do projeto – para demonstração ao público visitante – nas águas da Baía de Guanabara, havia sacolas plásticas, garrafas de refrigerante, embalagens de alimentos, pellets (matéria-prima da indústria plástica), brinquedos, chinelo, cotonetes e diversos outros.

 Lucas Barbosa)

(Resíduos coletados na Baía de Guanabara (Foto: Lucas Barbosa)

Entre crianças, jovens, adultos e idosos, a Tenda recebeu um público diverso, a maioria da capital do Rio de Janeiro, além de outras cidades fluminenses, como Queimados, Duque de Caxias, São Gonçalo, Volta Redonda e Niterói. Também houve visitas vindas de outros estados como São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Bahia, Pernambuco, Ceará, Alagoas, Pará e Paraíba; e inclusive houve a presença de um público estrangeiro, de países como: Peru, Argentina, Hungria, Alemanha, França e Gambia – resultado da intensa movimentação dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos.

Miguel e Davi, de sete e oito anos, respectivamente, gostaram da experiência da Tenda. Ambos disseram que o lixo pode matar os animais, contaminando-os. Também falaram que, quando encontrassem um amiguinho jogando algum lixo no chão, iriam orientá-lo, dizendo: “Pegue seu lixo e coloque-o na lixeira”.

 Tássia Biazon

Os visitantes da tenda, Miguel (centro) e Davi (direita) (Foto: Tássia Biazon)

Ao final da interação na Tenda, os participantes responderam um pequeno questionário. Uma das perguntas avaliava o nível de aprendizado após a atividade: 62% classificaram como excelente e 37% como ótima. Outro questionamento era se indicavam a replicabilidade do projeto, e o ‘sim’ foi unânime.

Os resultados obtidos durante a atividade foram apresentados em uma palestra ministrada pelo coordenador do projeto, o professor Alexander Turra, no Observatório do Museu do Amanhã, em 16 de setembro. Ele ressaltou que a atividade atingiu cerca de duas mil pessoas e comentou:

– O lixo diz muito sobre nós, e nós precisamos olhar para ele. Somente conhecendo o problema a fundo poderemos promover, de forma compartilhada entre todos os setores da sociedade, a mudança necessária.

Turra esclareceu que a maior parte do lixo coletado no ambiente marinho, assim como na Baía de Guanabara, é originada do ambiente terrestre – o plástico é o que aparece em maior quantidade pelo fato de flutuar, dispersar-se com as correntes, e não degradar com facilidade. Entretanto, há muitos outros poluentes submersos ou dissolvidos nas águas.

 Lucas Barbosa)

Palestra do Prof. Alexander Turra no Observatório do Museu do Amanhã (Foto: Lucas Barbosa)

Na plateia, com cerca de 30 ouvintes, o professor de ciências, Vitor Barbosa dos Santos, que leciona para o ensino fundamental em Magé, na Região Metropolitana do Rio, destacou:

– O meu interesse em assistir a palestra foi pela dificuldade em estabelecer, na comunidade próxima à escola onde leciono, políticas que ajudem a minimizar os efeitos do lixo e esgoto lançados em rios que chegam à Baía de Guanabara – relatou. – Cachoeiras, rios, canais e complexos lagunares, por um processo natural de lixiviação, carregam tudo que está em suspensão em direção ao mar. Caso não haja uma política de conscientização e educação ambiental com as comunidades e indústrias que ficam às margens desses pontos estratégicos, enfrentaremos a problemática de lidar com tudo que é lançado nos corpos d’água – concluiu.
Vitor Santos acredita que ações como o “EnTENDA o Lixo” são muito importantes no processo de conscientização, e poderiam ser incentivadas via redes sociais (Facebook e WhatsApp).

– Em se tratando da Baía de Guanabara, as comunidades localizadas na Baixada Fluminense, afastadas do centro do Rio, necessitam de políticas que mostrem que os ecossistemas se comunicam, dependendo da mobilização dos municípios, para que possamos alcançar nossos objetivos – conclui.
Uma das oceanógrafas que compôs a equipe do projeto, Marina Santana, relata um desafio: atrair o público.

– Temos a clareza sobre “o que fazemos”, a maioria reconhece a importância do “porquê fazemos”, mas falta estruturar melhor o “como fazemos” – observa.

Ela acredita que nas próximas edições da Tenda possa ser usado algo de maior impacto visual para aproximar o público. Além dos desafios e do aprendizado, Santana declara que os desdobramentos positivos foram vários, como novas parcerias de projetos e a sensibilização de pessoas que nunca tinham pensado sobre o assunto.

Sensibilizadora, dialética e participativa, a ideia é que a atividade percorra diferentes localidades, situações e públicos, se torne referência na discussão sobre o lixo nos mares e aumente a mobilização para a melhoria da qualidade do ambiente marinho.

Durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia de 2016, o “EnTENDA o Lixo” novamente entrou em ação, desta vez na Cidade Universitária da USP, demonstrando seu potencial itinerante.

– Trabalhos educativos promovem mudanças de atitudes nas pessoas, por exemplo, quanto à forma como dispõem seu lixo, evitando que o mesmo chegue aos mares e oceanos – declara Turra.

Nesse sentido, o professor reforça a parceria da iniciativa privada na viabilização de ações que busquem a melhoria da qualidade de vida e, com isso, do ambiente marinho.

*Tássia Oliveira Biazon é formada em Ciências Biológicas (bacharelado e licenciatura) pela Unesp Botucatu, com dupla diplomação pela Universidade de Coimbra, Portugal. Atualmente, é estudante de pós-graduação em Jornalismo Científico na Unicamp, onde é repórter na Revista ComCiência. Também desenvolve um projeto de divulgação científica do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP), financiado pela bolsa Mídia Ciência da FAPESP, sob a orientação do Prof. Dr. Alexander Turra.

O Museu do Amanhã é gerido pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão – IDG, e conta com patrocinadores e parcerias que garantem a manutenção e execução dos projetos e programas ao longo do ano. O projeto é uma iniciativa da Prefeitura do Rio de Janeiro, concebido em conjunto com a Fundação Roberto Marinho, instituição ligada ao Grupo Globo.