Para onde caminha a astronomia?
Por Meghie Rodrigues *
O mundo da ciência ferveu com a notícia de que pesquisadores do Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory (LIGO), operado pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia e pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos EUA, conseguiram detectar as ondas gravitacionais previstas por Albert Einstein em sua Teoria Geral da Relatividade, há cerca de um século. Os investimentos em tempo, dinheiro e pessoal do laboratório rendeu à comunidade astronômica mundial o que pode ser uma mudança radical na forma como enxergamos o Universo – ao invés de apenas vê-lo, pode ser que agora consigamos “escutá-lo” com mais do que nossos ouvidos.
Além de ser uma amostra do refinamento que se conseguiu atingir em pesquisa observacional hoje, o sucesso de experimentos como este traz consigo várias perguntas. Dentre elas, como será a astronomia no amanhã. O que astrônomos veem como tendências que poderão impactar o futuro do campo em algumas décadas?
Para discutir estas questões, o Observatório do Amanhã conversou com três astrônomos do Observatório Europeu do Sul (ESO, no acrônimo em Inglês) no Cerro Paranal, porção norte do Chile no deserto do Atacama que abriga o Very Large Telescope (VLT), um dos maiores telescópios óticos do mundo.
Uma das tendências que eles apontam é a maior precisão em estudos realizados em comprimentos de onda diferentes. O espectro eletromagnético abrange desde ondas “longas” de baixa frequência, como as de rádio, a ondas de raios X e raios gama, de maior frequência, passando por outros tipos de onda, como as da luz visível e ultravioleta.
Analisar uma galáxia combinando ondas de rádio e luz visível pode trazer muito mais detalhes sobre sua formação e ciclo de vida do que usar ambas as técnicas isoladamente. Isto porque “cada intervalo de comprimento de onda traz informações diferentes”, salienta Dimitri Gadotti, astrônomo residente do ESO no Cerro Paranal. Poeira estelar, por exemplo, bloqueia alguns sinais que poderiam ser captados por tecnologias óticas, mas não por outros comprimentos de onda, como as de rádio ou raios gama.
Outra direção que Gadotti ressalta é a interface entre astronomia e "big data", ou a produção, armazenamento e processamento de dados em quantidades massivas. O acúmulo de uma quantidade cada vez maior de dados representa um desafio porque ainda é difícil que softwares realizem, de forma automática, funções que uma pessoa sabe fazer, como selecionar e interpretar informações. Seria necessário, de acordo com o astrônomo, um “grande empurrão tecnológico tanto do ponto de vista das engenharias quanto do desenvolvimento de software – o que traz um retorno significativo para a sociedade como um todo”, ressalta.
"Grande" – palavra de ordem para o futuro
Na produção desses "big data" estão grandes instrumentos como o VLT, o telescópio espacial James Webb e observatórios como o Square Kilometre Array (SKA) e o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA). Há, também, telescópios extremamente grandes em construção, como o Thirty Meter Telescope (TMT), European Extremely Large Telescope (E-ELT), o Giant Magellan Telescope (GMT). A previsão é de que fiquem prontos na próxima década.
Para Claudio Melo, diretor científico do ESO Chile, “grande” parece ser mesmo a palavra de ordem para o futuro. Para ele, a precisão em resolução e sensibilidade dos telescópios dependerá do sucesso dos telescópios extremamente grandes. “O desafio não é apenas tecnológico, mas financeiro, logístico e de gestão de grandes consórcios – não é possível fazer ciência isoladamente”, enfatiza.
A astronomia não será diferente apenas no que toca a novas técnicas e novos instrumentos no futuro – o papel do astrônomo também tende a se modificar. De único responsável pelas observações, manutenção de telescópios e publicação de resultados há alguns séculos, o astrônomo é parte de uma estrutura crescente em complexidade e diferentes funções.
Bruno Dias, pesquisador visitante do ESO, destaca que a astronomia depende tanto do trabalho conjunto de equipes de logística, recursos humanos e comunicação quanto de engenheiros ópticos, eletricistas, mecânicos e técnicos em Tecnologias da Informação. E ele concorda com Melo e Gadotti no que diz respeito à necessidade de desenvolvimento de instrumentos cada vez mais complexos e com maior poder de processamento de dados para responder às perguntas que surgem na astronomia.
– Astrônomos decidem que especificações tecnológicas são necessárias para responder a uma determinada pergunta e os engenheiros mostram o que é possível ser feito – explica. A astronomia do amanhã depende, assim, mais do que das perguntas que surgem, da forma como será viável respondê-las. E há muitos caminhos possíveis.
* Meghie Rodrigues é mestre em Divulgação Científica e Cultural pela Universidade Estadual de Campinas e pesquisadora do Observatório do Amanhã.