Novos Horizontes | Museu do Amanhã

Novos Horizontes

Observatório do Amanhã
Nosso pesquisador do Observatório do Amanhã, Davi Bonela, em um palco de um auditório apresentando seu projeto. Ao fundo uma tela escrito "New Horizons".

Davi Bonela*

O astrônomo persa Al-Sufi descobriu a galáxia de Andrômeda sem ajuda de telescópios no ano 905. Mais de mil anos depois, usando um dos muitos aplicativos de astronomia disponíveis para celular, eu a descobri também. Fiquei fascinado: aquele ponto brilhante que eu via com meus próprios olhos no céu escuro estava a 2,5 bilhões de anos-luz de distância de mim. É o ponto mais distante que enxergamos da Terra a olho nu.

Acho que foi nessa noite que eu, que sempre trabalhei comunicando as soluções da ciência para os desafios da sociedade e do planeta, abri os meus olhos para o universo. E confirmei algo que os nossos ancestrais coletores, expedicionários, navegantes e mais recentemente os astronautas nos contaram: os horizontes mudam, e com eles mudam as nossas perspectivas das coisas. Gagarin viu a Terra inteira do espaço. Nós vemos a galáxia de Andrômeda inteira, incluindo suas mais de cem milhões de estrelas, da Terra.

Essa consciência somada ao fato de ser pesquisador da gerência que cria e mantém atualizadas as exposições do Museu do Amanhã me levou a me candidatar a um programa da Ettore Majorana Foundation and Centre for Scientific Culture. Uma vez por ano, a organização italiana, sediada na antiga cidade de Erice, na Sicília, seleciona cientistas e profissionais de divulgação científica para debater como o avanço das fronteiras do conhecimento será acompanhado por todos. Conquistei, com o apoio do Museu do Amanhã, um dos cinco fellowships oferecidos para quem não mora na Europa – e você conhecerá um pouco mais sobre os outros selecionados da Índia, do Japão e do Egito no site do Museu.

A edição deste ano abordou astronomia, cosmologia e pesquisa espacial. O programa oficial, que aconteceu numa igreja do século XV, transformada em palco de conferências de vencedores do Prêmio Nobel, contou com pesquisadores da Sapienza Università di Rome, do CERN e do ESO, o Observatório Europeu do Sul. Por sua vez, especialistas em comunicação davam oficinas sobre como abordar esses temas na imprensa, em museus e centros de ciência.
 
Até para os cientistas o universo é imenso de um modo difícil de imaginar. O mundo dos átomos - que abrange aglomerados gigantes como Andrômeda e minúsculos como o microbioma que habita nosso corpo - corresponde a 5% do cosmos. Todo o restante está para ser desvendado. Na teoria mais aceita, uma energia escura comporia 70% do universo e uma matéria escura 25%. Percebidas até o momento apenas de forma indireta, a energia acelera a expansão do universo, enquanto a matéria influencia a dinâmica entre os corpos celestes. Identificá-las se tornou um dos maiores desafios da humanidade para compreender o universo que habitamos.


Representação do universo visível, os 5% do cosmos, produzido pelo Sloan Digital Sky Survey, projeto realizado no Observatório de Apache Point, nos Estados Unidos, que já mapeou as posições e distâncias de 565 milhões de galáxias e identificou 76 milhões de quasares.

Uma das apostas dos palestrantes que estiveram na Itália é de que a solução virá do Chile, na cordilheira dos Andes, onde está o Observatório Interamericano de Cerro Tololo, sede do projeto Dark Energy Survey. Um telescópio de quatro metros com a maior câmera digital do mundo busca por um padrão da estrutura cósmica que possa revelar a natureza da energia e da matéria escuras. A pesquisa, que já dura quatro anos, divulgou recentemente a quantidade e a distribuição de matéria escura no universo de hoje. Um feito enorme para conhecer melhor a estrutura de grande escala do universo.
 
Um dos objetivos do programa na Itália era que os participantes apresentassem projetos em que pusessem os novos conhecimentos em prática na volta aos seus países de origem, por meio de iniciativas de divulgação científica. A minha proposta é usar telescópios com estudantes das escolas públicas próximas do Museu para falar das distâncias entre os planetas, estrelas e galáxias para os quais existem grandes pesquisas em curso, seja para alcançá-los ou para compreendê-los melhor. E, em especial, Marte. A NASA planeja levar um astronauta ao planeta vizinho até de 2030. Por isso, tem estimulado os museus de ciência a levar essa jornada aos mais jovens, aos quais a agência espacial chama de Mars Generation, a geração Marte.

Mas o Museu do Amanhã tem a vocação de falar do horizonte da humanidade, sem esquecer os horizontes de cada pessoa. Então, baseado nessa possibilidade de habitarmos outro planeta, minha proposta é também abrir espaço para atividades educacionais nas quais os estudantes falem sobre as distâncias que querem percorrer na sua vida e a jornada que imaginam que devem seguir até aonde querem chegar.

Assim, combinamos uma agenda da NASA com uma agenda das Nações Unidas, que também vai até 2030, de estimular entre os mais jovens as competências socioemocionais chamadas de habilidades da vida. Afinal, dependendo da circunstância, um passo desses estudantes pode ter o tamanho de um ano-luz. No fim da minha apresentação todos concordaram que o projeto só poderia ter um nome: novos horizontes – mesmo nome da sonda a alcançar Plutão, que já foi o planeta mais distante no nosso Sistema Solar.

*Davi Bonela é pesquisador da gerência de Exposições e do Observatório do Amanhã.

O Museu do Amanhã é gerido pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão – IDG, e conta com patrocinadores e parcerias que garantem a manutenção e execução dos projetos e programas ao longo do ano. O projeto é uma iniciativa da Prefeitura do Rio de Janeiro, concebido em conjunto com a Fundação Roberto Marinho, instituição ligada ao Grupo Globo.